a vida não pára por causa das coisas não entendidas.



Fado Alexandrino escreve nos comentários do post abaixo...
E claro fui reler o artigo.
O que é que lá está escrito que seja mentira?
Qual é o pensamento que não esteja de acordo com a realidade?
.
Bom, só agora tive oportunidade de ler o resto do artigo -pena porque o resto ainda é melhor!-, mas vamos a tempo.
Diz assim: Todos sabemos como a cultura progressista, manifestada por intelectuais, leis, telenovelas e programas educativos, se opõe à chamada "família tradicional". No antigo regime obscurantista a fertilidade portuguesa manteve altos valores, à volta de três nascimentos por mulher, até ao início da década de 70. Com a democracia e desenvolvimento começou a tendência moderna de queda da fertilidade (...)Não se pode dizer que se trata de uma fatalidade sistémica, porque em países próximos os esforços atentos têm conseguido inverter a trajectória. Trata-se mesmo de uma específica estratégia nacional. link
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Todos sabemos como a cultura progressista, manifestada por intelectuais, leis, telenovelas e programas educativos, se opõe à chamada "família tradicional".
Fado, eu admitia este discurso aos analfabetos lá da minha terra, depois de um dia na fazenda com 40º à sombra e um ou dois garrafões de vinho...e até era capaz de me rir quando diziam que a culpa das mulheres serem menos obedientes, de já não se conformarem com duas bofetadas, ou de já não se sujeitarem a ter 10 filhos, ou pensarem em mariquices como ter menos filhos para lhes dar melhores condições de vida, dizia eu, que até era capaz de me rir quando resmungam que a culpa é da televisão, e das das revistas, e das novelas; até sei de alguns que as proibiram de ver televisão.....é triste, mas coerente. Agora!, pelos vistos não eram só os analfabetos da minha terra, há professores universitários que pensam o mesmo. Repara: a cultura progressista, manifestada por intelectuais, leis, telenovelas e programas educativos, se opõe à chamada "família tradicional"....horror dos horrores!! o Senhor Doutor fala de cultura progressista por oposição a que cultura? as novelas, aquelas coisas que nos fazem ver o mundo cor-de-rosa, romântico, em que tudo acaba bem com paz e amor e cenas de casamentos, opõem-se à família tradicional?? isto parece-te uma afirmação lúcida ou coerente?
Diz ainda o senhor que "No antigo regime obscurantista a fertilidade portuguesa manteve altos valores, à volta de três nascimentos por mulher, até ao início da década de 70." Claro, e sabes porquê? porque as famílias tinham 10 filhos para ficarem com 4 ou 5. Porque a taxa de mortalidade era e.s.c.a.n.d.a.l.o.s.a!! Porque qualquer criança que tivesse uma simples diarreia ou que por qualquer motivo não pudesse ser amamentada morria. Basta falar com mulheres da idade das nossas avós, e verás que é raríssima a que não enterrou algum filho. Ou vários. Onde estava esse Senhor, onde estavas tu, Fado, que não te lembras disso? E claro que à medida que a mortalidade infantil desceu, tornou-se mais óbvia a necessidade de controlo da natalidade. Não só porque manter tanta criança era insustentável, como, o maldito progresso e as malditas televisões meteram na cabeça de muita gente que ter os filhos que se pudessem educar com alguma dignidade, talvez não fosse má ideia.
Mais, o que desertificou Portugal não foi a baixa de natalidade, foi a necessidade de emigração. E foi exactamente nessa gloriosa época-do-obscurantismo-em-que-as-mulheres-cumpriam-a-sua-função-e-a-fertilidade-mantinha-altos-valores, as tais que ainda não estavam contaminadas pela educação sexual laxista, que o país não soube avançar o suficiente para reter os seus filhos, para os acarinhar e para neles apostar... exactamente por causa desse obscurantismo de que o senhor doutor fala, por falta de progresso, por falta de perspectivas de futuro... é nisso, que efectivamente nos distinguimos dos outros. Não é pela educação sexual laxista, nem pela despenalização do aborto, nem pela facilidade do divórcio, nem pelas uniões de facto, nem pela promiscuidade, nem pela homossexualidade. Se alguma culpa os políticos têm, é a falta de apoio à maternidade. E não me venhas com a conversa do aborto Fado, que o sonho da maioria das mulheres ainda é serem mães! Coitados dos homens que não entendem isso, coitados...não me digas que não há mais crianças porque as mulheres fazem abortos: é uma visão do problema escabrosamente limitada. E para náusea já me basta o outro....

Comentários

Hipatia disse…
Quando o Papa "me chamou" terrorista por ser pró-IVG, escrevi um post em que admitia ser realmente terrorista "nesse sentido", já que representava muito daquilo que na actual condição feminina "aterroriza" uma certa mentalidade mofada, que quando olha para trás na História tem uma visão assustadoramente selectiva do que era "bom" e do que era "mau".

Na altura escrevi:

Talvez eu personifique de facto o terror daqueles que não sabem o tanto de medo que os move: mulher branca, adulta, com direito a voto e voz, independente, senhora do meu ganha-pão e autoridade para dispor dos seus proveitos, que nunca quis ser só esposa, ou só mãe e muito menos cônjuge; defensora do direito à vida cada vez que o carrasco se aproxima com o nó corrediço ou a injecção letal; defensora da vida de todas as mulheres, até daquelas que não querem ser mães; defensora da eutanásia, porque somos livres de dispor do nosso corpo enquanto ainda temos capacidade para decidir em consciência; defensora da pesquisa científica, mesmo que em células embrionárias, porque todas as vidas que podem ser salvas merecem esse esforço; defensora do preservativo e dos contraceptivos; defensora de uma Igreja que, se se quer virar para a família e fomentar valores familiares, então tem de passar a saber o que é constituir família; defensora de impostos para os padres; defensora de um Estado laico onde os representantes de apenas uma igreja, bem como os símbolos dessa mesma igreja, não têm lugar em cerimónias que se dirigem aos cidadãos, todos os cidadãos, sem diferenciar nem credo, nem raça, nem género.

Acho que vou continuar a ser uma terrorista assim. E, ah!, quase esquecia: já passei a metade dos trinta e ainda não fiz um filho. Plantar uma árvore ou escrever um livro continuam a ser metas, ainda assim :)
Cristina Vieira é médica, dona de uma sólida formação intelectual e com um sentido de humor excepcional.
João César das Neves é um reputado economista, com obra publicada e com pouco sentido de humor.
Ambos escrevem lindamente.
È neste duelo de Titans que sou chamado a dar a minha opinião, uma vez que um não sabendo da existência do outro, não a vai dar seguramente.


É claro que todos os assuntos do Mundo podem ter duas leituras e isso depende da posição política que cada um tem no seu íntimo.
Deixem-me ilustrar esta opinião com um engano perfeitamente aceitável, como outros:

O engenheiro electrónico Marcelo Areias, leitor da Folha Online, encarou o vai-e-vem do sector aéreo brasileiro para embarcar em um vôo da Varig de São Paulo com destino ao aeroporto Santos Dumont, no Rio, na manhã desta segunda-feira. "Mesmo quando o movimento é baixo, existem problemas nas companhias aéreas, na Infraero [estatal que administra os aeroportos do país], em todo o sector", afirma Areias.
Confira o relato do leitor:
5h28 - Chego ao aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, na Grande São Paulo, para ver que meu vôo, marcado para as 6h45, havia sido atrasado para as 10h30.


Como se compreende para ele o voo está atrasado (é isso que ele sente, porque vai chegar atrasado) mas na realidade está é adiantado (na hora).
Assim sendo o essencial do post de João César das Neves foca, no seguimento de muitos outros, a dissolução dos costumes, a promiscuidade sexual, a ausência de valores, o primado do lucro sobre o indivíduo, o individualismo feroz que são agora o paradigma de uma grande parte da sociedade.
Eu acho que estes fenómenos, não precisam de demonstração. Basta ler os jornais e ver os telejornais.
È por isso que não acho grande relevância em vir aqui analisar palavra a palavra o que um ou outro dizem, provavelmente ambos tem razão e apenas vêm o problema com olhos diferentes e diferentes métodos de análise.

Deixem-me, no entanto, transcrever dois apontamentos de João César das Neves.

Do casamento:

O mais curioso é que o casamento estava sob ataque até os homossexuais o considerarem excelente. É já quase mais fácil divorciar-se do que casar (o artigo foi escrito em Maio de 2004, e mal ele sabia que ia tornar-se verdadeiro) e defender o casamento era, até há pouco tempo, ofensivo para a dignidade das uniões de facto, que não podem ser discriminadas. Toda a gente via os defeitos, falhanços e inanidade do casamento. Agora, por esta razão, descobrem-se as suas eminentes virtudes insuspeitas. Parece que afinal a união de facto, excelente para os casais comuns é inaceitável para os homossexuais, e o seu casamento é, não só necessário, mas indispensável.

Do Sexo:

Vivemos na primeira época que caiu no ridículo de tentar eliminar tabus e estimular o sexo, não por razões pessoais mas por interesses comerciais. Vivemos mergulhados em estímulo sexual por causa dos carros, revistas e sabonetes. O sexo é hoje uma indústria de sedução e manipulação por estratégia empresarial

Eu, como nota final, pergunto-me.
Nas telenovelas para garotos toda a gente anda com toda a gente e de uma maneira mais que explícita sugere-se que a vida sexual deve começar bem cedo e com quantos mais melhor.
Nas revistas cor-de-rosa os ídolos da juventude dizem as maiores barbaridades e saltam de cama em cama, resvista sim, revista sim.

Isto é o modelo que queremos para os nossos filhos?
Cristina disse…
Fado

este é o modelo que queremos para os nossos filhos?
o modelo que eu quero para a minha filha é um e só um: o que a faça feliz.
tanto se me dá que seja com um, com dois com duas com três, o que ela bem entender.é-me sinceramente indiferente. só lhe peço que construa um mundo em que não precise de depender de terceiros,pois pode ser essa a única limitação à sua liberdade. foi aquilo que a minha mãe me ensinou e não me dei mal...

arrepia-me essa ideia d' "a ausência de valores". os valores que preservo, ou tento, não são esses, são outros. outros que não têm nada a ver com a vida sexual das pessoas. há coisas mais importantes. mas em cabeças como as do Professor o mundo gira à volta disso: da vida afectiva dos outros. melhor seria se girasse à volta da sua...que obviamente, deve ser profundamente....desinteressante.


bj
Cristina disse…
Hipatia

obrigada. por caso....não me pareces nada vazia de valores :)))

um beijo
Cristina disse...

Como, claro está sabes, desejo-te as maiores felicidades e á tua filha Beatriz, agradecendo tantas provas de estima que recebi.

Infelizmente, por vezes, e embora pareça contraditório, a felicidade de uns é a infelicidade de outros.
batuta disse…
Tenho uma sugestão a fazer, Cris.
O assunto tratado pelo Cesar das Neves, independentemente do modo como ele o coloca, é um dos problemas/desafios mais sérios que se colocam ao país.
No plano financeiro, certamente, mas também no plano da própria viabilidade do Portugal Estado-Nação independente.
Dirás tu que isto é um exagero, mas não é.
A este ritmo demográfico, tendemos, a prazo, a ser inviáveis.
Dirás tu que isto é um exagero, mas não é.
Como discutir o César das Neves me parece cada vez menos estimulante, se não mesmo uma perda de tempo, porque não te dispões a captar, no ContraCapa, as opiniões que este assunto possa suscitar aos teus leitores?
Assuntos destes, vale mesmo a pena reflectir sobre eles.
De diagnósticos e estatísticas estamos servidos. Mas ainda não ouvi uma voz autorizada e com responsabilidades a apontar caminhos para a solução desta enorme encruzilhada.
Não sei em que pensam os políticos desta medíocre república, mas sei que estes problemas não se resolvem só com cheques paliativos, que é o que me parece terem para oferecer.
Enquanto os portugueses não começarem a discutir o que é realmente importante, e interiorizarem os seus problemas e desafios, tudo isto continuará a ser uma brincadeira de socrates, mendes e menezes, enquanto o país definha.
MC disse…
Tenho de prestar homenagem a voces.
Cristina, acho fantastico o que escreves e a maneira como escreves. Independentemente de concordar ou não com a opinião que sai dos teus textos. Admiro tudo isso e, por isso, sou obrigado a admirar-te como pessoa, mesmo sem te conhecer. Mesmo reconhecendo em ti um grande defeito e uma grande virtude. A virtude é, óbviamente, o teu gosto pelos petiscos e pelo "convivio do lanche". É claro que o grande defeito é essa costela benfiquista mas ninguém é perfeito, não é?
Presto também uma homenagem ao Fado Alexandrino pela maneira lucida e esclarecida como defende o seu ponto de vista.
Acho que talvez tenham os dois razão. No geral. No fundo, depende muito do angulo de abordagem ao assunto, como muitas vezes acontece.
Enfim, parabens aos 2, mas especialmente a ti Cristina, pelo excelente canto que tens.
Cristina disse…
Fado

muitas vezes, e neste tema nem se fala...

obrigada, o mesmo para ti, como também sabes.

beijo
Cristina disse…
batuta

claro que é um problema, é uma encruzilhada, claro que tem que haver soluções. mas não me parece que voltar para trás no tempo seja a solução...e realmente, estes assuntos, importantes, só têm a perder com interpretações como essa, do Cesar das Neves.

como poderia reunir opiniões e hipóteses sem ser como tem sido, nos comentários?
Cristina disse…
miguel

obrigada.

são interpretações diferentes, mas só ha duas opções: ou se avança ou se volta para trás meio século, que parece ser o que o autor do artigo deseja...

assim é dificil discutir, na base da limitação da liberdade individual de cada um. ou do respeito pelos outros.

um beijo
Cristina disse…
Batuta

querias uma opinião??

está

aqui

:)
Cristina disse…
se quiseres os comentarios e o link em ecran total, carrega na tecla Ctrl ao mesmo tempo que abres a caixa..
Cristina disse…
e mais acrescenta o Pedro Dória:


Imigração para países que já tem o problema faz parte da solução. Se gente de países pobres onde os recursos são parcos e a natalidade alta migrar para os países ricos, onde a tendência é inversa, estabiliza-se parcialmente econômico e a qualidade do mundo melhora.

Também será preciso trazer mais mulheres para o trabalho. Faz-se isso da seguinte forma: licença maternidade generosa**, licença paternidade idem (os pais têm de ajudar), creches de fácil acesso. Políticas sociais, não arrocho e corte de direitos***, são a solução.

**tenho duvidas que essa medida ajude: prejudica a carreira e os empregadores. eu apostaria nas creches nos locais de trabalho.
*** depende dos direitos.
Pou uma feliz coincidência, hoje no Público Helena Matos e José Vitor Malheiros abordam este mesmo problema (a natalidade e a educação das crianças)com pontos de vista que afinal vêm, em certa medida, apoiar a versão mais extremista de JCN.

Como não têm links pode ser que a Cristina num dos seus belos exercícios de corte-cola-análise os venha aqui mostrar (com os seus olhos).

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