amanhecer

Tinha dormido pouco, por alguma estranha razão, sentia-se inquieta, ansiosa, com um turbilhão de ideias a vaguear pela mente. Mexeu-se timidamente, voltou a abrir os olhos e mais uma vez verificou que ele estava ali, incrivelmente perto.
Contemplou religiosamente as linhas do seu rosto, os traços firmes da boca onde se adivinhava um sorriso. Sentiu-lhe a respiração, o calor, a serenidade. Subitamente, percorreu-a um desejo irresistível de lhe tocar, mas resistiu. Estava ali, ao alcance das mãos, mas não quis perder esse momento mágico de intimidade em que pela primeira vez, como que por milagre, se sentiu protegida, segura, amada. Ainda emocionada pela descoberta, olhou-o de soslaio, entre o espanto e o prazer de quem descobre a própria vida, era seu, que mais poderia desejar? Deixou-se vencer pelo cansaço até uma onda de relaxamento lhe invadir o corpo. Sentiu-se mais abençoada do que nunca e de repente, as manhãs pareceram-lhe perfeitas, os dias desejáveis e tudo o que viesse absolutamente viável.
Manteve-se imóvel, velando-lhe o sono, quieta, com a certeza de que tudo valia a pena. Sorriu, fechou os olhos e finalmente adormeceu.